13 fev 2019 | 18:09:35

Artigo: Hi Happy e um exemplo a ser seguido

Do aspecto econômico ao técnico, o retorno do campeão argentino, ao país de origem, agora como reprodutor, merece ser visto com bons olhos e atenção. Sobretudo, por nós, brasileiros.


Em meados de janeiro, diversas publicações da mídia turfística noticiaram que o argentino Hi Happy, então em ação nos Estados Unidos, havia encerrado sua campanha. Mais: as reportagens davam conta de informar que Hi Happy retornaria ao seu país de origem, a fim se servir como reprodutor.

Hi Happy: cavalo do ano na Argentina e ganhador de G1 nos EUA, traz no pedigree elementos de sucesso na criação portenha.

Imagem: NYRA Photos

Até aí, nada de muito surpreendente. Aliás, muito pelo contrário. Estamos falando de um dos melhores exemplares PSI criados no país vizinho, nos últimos anos. Sobram-lhe credenciais para ocupar o piquete de garanhões de qualquer haras argentino, inclusive do próprio Haras La Providencia – seu criador e proprietário – onde irá servir. Onde estaria, então, o fator surpreendente, ou digno de atenção, envolvendo o regresso de Hi Happy?

Conforme sugerido, o aproveitamento de Hi Happy ilustra, em matéria de turfe, o óbvio ululante rodrigueano. Por determinadas ocasiões, porém, optou-se, em terra brasilis, por negar o próprio óbvio.

Vencedor dos 2000 Guinéus (gr.I) em San Isidro, onde também venceu os Gran Premios Carlos Pellegrini (gr.I) e Jockey Club (gr.I) – sem prejuízo de uma vitória cinematográfica obtida no GP Nacional (gr.I), que fez dele o primeiro animal a emplacar o double Derby e Pellegrini desde Freddy, protagonista do feito no ano de 2002. Seu pai, Pure Prize (filho de Storm Cat na campeoníssima Heavenly Prize), foi, por duas vezes, vencedor da estatística de reprodutores, na Argentina. A mãe, Historia (French Deputy), por sua vez, revela-se uma múltipla produtora de ganhadores de G1 (todos eles, na Argentina). Em suma, fatores em abundância a fim de lastrear o aproveitamento de Hy Happy, como garanhão local.

Primeiro "repatriado" - após campanha no exterior - de maior expressão, Romarin produziu, desde penqueiros de sucesso, até ganhadores do Derby.

Imagem: Itajara.com

Desde a década de 1990, quando da intensificação das exportações do PSI brasileiro (ora comercializados, de fato, ora levados para o exterior a fim de competir para os interesses do proprietário original), alguns dos nossos melhores animais rumaram a outros países, sem passagem de volta. Logo na primeira ocasião, porém, na qual se decidiu por “repatriar” um desses animais, Romarin (ingressou na reprodução em 1997) mostrou que, a partir desse planejamento, bons frutos poderiam surgir. Depois de desenvolver boa campanha nos Estados Unidos, foi pai, no Brasil, desde ganhadores de pencas até vencedores do Derby, na milha e meia. Por 4 vezes recebeu o Troféu Mossoró de Melhor Reprodutor Nacional.

Um pouco adiante foi a vez de Redattore, após campanha estupenda na América do Norte (com direito a vitória em prova de G1 aos 8 anos), voltar ao Brasil para atingir números impressionantes, como garanhão. Mesmo tendo cumprido temporadas de monta, sazonalmente, nos Estados Unidos, o filho de Roi Normand foi capaz de conquistar, aqui, por 7 vezes o Troféu Mossoró de Melhor Reprodutor Nacional, à medida que produziu 9 ganhadores individuais de grupo I, sem prejuízo de outros tantos vencedores clássicos.

Redattore venceu o Troféu Mossoró de Melhor Reprodutor Nacional por, nada menos, que 7 ocasiões.

Imagem: Stud TNT

Talvez não por coincidência, os dois únicos reprodutores capazes de quebrar, até aqui, a hegemonia de Romarin (desaparecido em 2010) e Redattore (atualmente servindo como garanhão do Haras Old Friends, em Bagé) na aludida categoria do Troféu Mossoró, também foram reconduzidos ao Brasil, depois de conseguir resultados em pistas estrangeiras. Campeão milheiro em Cingapura, Setembro Chove viria a produzir ganhadores de G1, dos 1.600 aos 2.400m no Brasil, tendo vencido o Mossoró em 2014/2015. Já Fluke, múltiplo ganhador de G1 nos Estados Unidos, ainda é lamentado como considerável perda de nossa criação. De sua única geração (nascida em 2013), fazem parte a tríplice coroada, No Regrets, e a ganhadora da Taça de Prata, Nostalgie. Venceu a premiação na temporada 2017/2018.

Hard Buck, que além de se tornar vencedor de G1 nos Estados Unidos, protagonizou uma histórica segunda colocação no King George VI & Queen Elizabeth Stakes (gr.I), em Ascot, voltou ao país de origem para, dentre outros produtos, revelar o ganhador do Grande Prêmio Brasil (gr.I), Moryba. Com o desaparecimento de Hard Buck, em 2012, contudo, voltamos a nos desfalcar de uma opção de continuador para Spend A Buck, um de nossos mais brilhantes sementais. Àquela época ainda estava vivo Pico Central, que por falta de interesse ou proatividade brasileira, foi parar na Coréia do Sul – onde morreu, num acidente, um ano depois. Não demorou, porém, para que outro Spend A Buck, de nome Einstein (dono de 5 vitórias de G1 nos EUA), começasse a perder espaço no rol de reprodutores da Adena Springs. Ainda assim, ao que tudo indica, nunca houve esforços muito grandes – tal ocorreu com Pico Central – para tê-lo de volta ao Brasil.   

Em sua primeira temporada de monta, nos EUA, Bal A Bali cobriu 128 matrizes.

Imagem: Anne Eberhardt/Blood Horse

A exemplo de Spend A Buck, Put It Back foi capaz de gerar ganhadores de graduação máxima dos 1.000 aos 2.400 metros. Dentre os quais, Bal A Bali, seu mais brilhante produto e corredor de feitos comuns a pouquíssimos cavalos. Já em campanha, nos Estados Unidos, Bal A Bali restou adquirido Calumet Farm, para os interesses de quem Bal A Bali cobriu 128 éguas, logo na sua temporada inaugural, como reprodutor. Da mesma maneira como a Calumet tomou a iniciativa do negócio (realizada, frise-se, num momento de baixa da campanha de Bal A Bali, que à época ainda não havia vencido nenhum dos dois grupos I conquistados por ele, nos exterior), poderia tê-lo feito algum criador brasileiro, com vistas de ter para si os serviços de um animal de poderio locomotor extraordinário, com Put It Back e Clackson (receita genética talhada ao sucesso, no Brasil), em seu pedigree. Considerando a possibilidade de Bal A Bali tornar-se, num futuro próximo, grande demais para o Brasil (como, por exemplo, aconteceu com Leroidesanimaux), vale o olhar atento, desde logo, no que Flight Time, outro exemplar muito acima de média produzido por Put It Back (e também filho da super matriz, Quanto Carina), irá produzir em pistas norte-americanas. Realizou seu primeiro exercício cronometrado na Florida, há 1 semana, percorrendo 600 metros em pouco mais de 36s, no centro de treinamentos de Payson Park.

Por certo que algumas importações do tipo não lograram êxito, ou, ao menos, não resultaram no mesmo sucesso dos casos acima. Outras, porém, mesmo sem menção específica no texto, igualmente foram de grande valia, e permitiram que seus responsáveis obtivessem considerável retorno – sem que para isso tenham precisado investir suas cifras em incógnitas. Ademais, boas campanhas no exterior em nada devem provocar o demérito do potencial garanhão nacional, com campanha produzida, exclusivamente, no Brasil. Contudo, ao ser sabatinados em alguns dos mais exigentes polos e páreos do turfe internacional, e ainda assim, aprovados com louvor, produtos nacionais atestam possuir, de fato, predicados e diferenciação suficiente, para servir na reprodução. Já dizia o velho provérbio, que o bom filho à casa torna. É preciso, porém, ajuda-lo(s) nesse processo.

por Victor Corrêa

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