10 maio 2022 | 16:51:27

Arumba que resiste ao tempo

Na festa de Churchill Downs, New Year’s Eve manteve acesa a chama de Arumba, que, há quase 50 anos, ganhou vida para fazer história da criação nacional.


Quase cinquenta anos depois, New Year's Eve mantém acesa a chama de Arumba

Imagem: Barbara Livingston/Daily Racing Form

Rich Strike, diversas provas de grupo 1, uma multidão que, felizmente, voltou a frequentar Churchill Downs em seu principal final de semana. Foram várias as atrações e pontos altos do festival do Kentucky Derby 2022. Em meio a tantas estrelas e manchetes, contudo, um resultado perpetuou, em pista, a influência da genética desenvolvida a milhares de quilômetros de Louisville. Mais precisamente, no Brasil.  

New Year’s Eve (Kitten's Joy), numa retumbante atropelada, foi o oásis em meio às seguidas vitórias (e dobradas) do treinador Chad Brown (nas corridas “de grama” e destinadas às fêmeas, no meeting) por ocasião do Edgewood Stakes (G2), uma prova com meio milhão de dólares de bolsa, disputada em 1.700m, por potrancas de 3 anos.

Treinada por Brendan Walsh e conduzida por Luis Saez, a crioula da seção norte-americana do Stud TNT fez pouco caso das qualificadas McKulick e Dolce Zel, vencendo por 2 corpos e ¾. Em quatro corridas, venceu três, sendo esse seu primeiro êxito black type.

Ao se analisar uma determinada linha materna, há grande dose de relatividade acerca dos seus pontos de potencialização, muito embora os registros genealógicos possibilitem identificar “o início de tudo”. No caso de New Year’s Eve, contudo, é tarefa das mais ingratas não brilhar os olhos perante o nome de Arumba, sua quarta mãe.

A partir da argentina Yarumba (por sua vez contando com éguas da criação Ojo de Água e, depois, de Martinez de Hoz, em seu pedigree), a Pecuária Anhumas (posteriormente ao imóvel, em Campinas), José Bonifácio Coutinho Nogueira concebeu Arumba, no ano de 1975. Para isso, além da referida matriz, utilizou-se do nacional Viziane, um “prata da casa” do Haras São Quirino, que, em pista, foi um dos poucos a vencer os Grandes Prêmios Brasil e São Paulo.

A genética ensina a importância da seleção através da adaptação das espécies ao seu meio ambiente, às suas condições de trabalho. Por isso, a preferência do São Quirino é pelo bom garanhão nacional”, declarou o criador à reportagem da Revista Turf & Fomento, em outubro de 1987, ou seja, um pouco antes de Jarumba, o primeiro produto clássico de Arumba (esta ganhadora de 4 corridas, incluindo a PE Joaquim da Cunha Bueno, e terceira colocada no Clássico Pres. Sílvio Alvares Penteado [L]), conquistar sua primeira vitória, em Cidade Jardim.

Alguns meses depois, em março de 1988, Jarumba (uma Executioner) venceria o GP Pres. Fábio da Silva Prado (G2). Na reprodução, produziria Ojotabe, múltiplo ganhador clássico na década de 1990 e que precisou medir forças com nomes do quilate de Much Better e Sandpit.

Além de Jarumba, Arumba daria à luz a outros dois ganhadores clássicos: Neto Joe, filho de Quintus Ferus que, no protagonismo dentre os potros de 2 anos “virando” para 3 anos, na Gávea, em 1991, conquistou, dentre outros páreos, o GP Linneo de Paula Machado (G1); e Outra Arumba (Henri Le Balafré), que viria a bater a norte-americana Little Baby Bear no Grande Diana (G1), em Cidade Jardim, no ano de 1992.

Todo o poderio de Arumba, entretanto, não se limitaria às campanhas dos filhos – como bem visto no exemplo de Jarumba – mas sim avançaria as décadas, vingando em pleno século XXI. Por meio de Poli Arumba (Executioner), revelou sua neta, Linda Rafaela (por Bin Ajwaad, adquirida pelo Stud TNT junto ao Haras São Quirino), vencedora do GP Marciano de Aguiar Moreira (G1), na Gávea, em 2003. Essa foi, inclusive, sua mais prolífica descendente, nos anos que estavam por vir. Linda Arumba produziu a ganhadora do Diana, em São Paulo, e clássica de G1, G2 e G3, nos Estados Unidos, Viva Rafaela (Northern Afleet), que, por sua vez, foi incorporada ao plantel de Wertheimer & Frere, na Europa.

Linda Rafaela também originou Unique Zuca (Northern Afleet), coadjuvante de luxo de Old Tune nas provas da tríplice coroa e que, como mãe, já conta com Galaxy Runner, ganhador de G2 na Gávea. Além disso, a própria New Year’s Eve, que dá corpo ao início deste texto, é sua neta, por meio de Awesome Rafaela (Elusive Quality), de duas vitórias, no Rio de Janeiro, e que restou exportada para os Estados Unidos, onde serve como reprodutora. No último mês de fevereiro, foi arrematada por Fergus Galvin junto ao Stud TNT, nas vendas da Fasig-Tipton.

Até aqui, entretanto, não se mencionou aquele que, por tempos e tempos, ainda será lembrado como “o” grande cavalo eternizado na descendência de Arumba. Filho da já mencionada Oaks winner Outra Arumba e dono de uma atropelada inesquecível, Dono da Raia encantou o país, no ano de 2006, quando venceu, em sequência, os Grandes Prêmios São Paulo (G1) e Brasil (G1).

Exportado para Dubai e longe dos profissionais que tão bem lhe conheciam, Dono da Raia acabou castrado. Para seus novos proprietários, o fato, certamente, foi insignificante e em nada afetou suas operações. Para eventuais interessados no Brasil, contudo, foi diferente. Terminou ali a oportunidade de repatriar aquele que talvez tenha sido o melhor descendente de Arumba e, assim, dar sequência ao seu legado, na qualidade de garanhão – numa triste ironia diante das lições deixadas pelo patriarca do Haras São Quirino, a respeito da utilização do reprodutor nacional.

Por Victor Corrêa

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